"Um caminho que se percorre não com pernas, mas com coração. E onde o único desafio que vale, é percorrê-lo por inteiro."


terça-feira, 25 de março de 2008

O ator

Por mais que as cruentas e inglórias batalhas do cotidiano. Tornem um homem duro ou cínico.

O suficiente para fazê-lo indiferente às desgraças e alegrias coletivas,

Sempre haverá no seu coração por minúsculo que seja, um recanto suave, onde ele guarda ecos dos sons de algum momento de amor que viveu em sua vida.

Bendito seja quem souber dirigir-se a esse homem que se deixou endurecer, de forma a atingi-lo no pequeno núcleo da sua sensibilidade.

E por aí despertá-lo, tirá-lo da apatia essa grotesca forma de autodestruição.

A que por desencanto ou medo se sujeita. E por aí inquietá-lo e comovê-lo para as lutas comuns da libertação.

O ator tem esse dom.

Ele tem o talento de atingir as pessoas nos pontos onde não existem defesas.

O ator, não o autor ou o diretor tem esse dom.

Por isso o artista de teatro é o ator.

O publico vai ao teatro por causa dos atores.

Os autores e diretores são bons na medida que dão margem a grandes interpretações.

Mas o ator deve se conscientizar de que é um cristo da humanidade, e que seu talento é muito mais uma condenação do que uma dádiva.

Ele tem que saber que pra ser um ator de verdade, vai ter que fazer mil e uma renúncias, mil e um sacrifícios.

É preciso coragem, muita humildade e, sobretudo um transbordamento de amor fraterno, para abdicar da sua própria personalidade em favor de seus personagens, com a única intenção de fazer a sociedade entender que o ser humano não tem instintos e sensibilidade padronizados, como os hipócritas pretendem com seus códigos de ética.

Amo o ator nas suas alucinantes variações de humor, nas suas crises de euforia ou depressão.

Amo o ator no desespero de sua insegurança, quando ele como viajante solitário sem a bússola da fé ou da ideologia é obrigado a vagar pelos labirintos de sua
mente procurando, no seu mais secreto intimo, afinidades com as distorções de seu personagem.

Amo o ator mais ainda quando, depois de tantos martírios, surge no palco com segurança, oferecendo seu corpo, sua voz, sua alma, sua sensibilidade, para expor, sem nenhuma reserva, toda a fragilidade do ser humano reprimido, violentado.

Amo o ator que se empresta por inteiro para expor a platéia os aleijões da alma humana, com a única finalidade de que seu publico se compreenda, se fortaleça e caminhe no rumo de um mundo melhor, que tem de ser construído pela harmonia e pelo amor.

Amo o ator que sabe que a única recompensa que pode ter não é o dinheiro, nem o aplauso, mas a esperança de poder rir todos os risos e chorar todos os prantos.

Amo o ator que sabe que no palco cada palavra e cada gesto são efêmeros, pois nada registra e nem documenta a sua grandeza.

Amo o ator e por eles amo o teatro, e sei que é por eles que o teatro é eterno e jamais será substituído ou superado por qualquer arte que tenha que se valer de uma técnica mecânica.


Plinio Marcos